Mercado Público de Blumenau
[projeto] Blumenau, Santa Catarina Ano do projeto: 2007 Autoria: Thiago de Andrade, Carlos Henrique Magalhâes e Filipe Monte Serrat Memória: Resgate, contraste e síntese entre a função pública e estética do mercado: um símbolo que se torna indispensável à vida da cidade pelo uso. 1. Contextualização Os mercados surgem, ao longo da história da civilização ocidental, em intrínseca e definidora relação com a cidade, passando a ser uma de suas geratrizes e uma das forças polarizadoras dos vetores de crescimento, configurando-se como o motor da economia, mesmo que primitiva, das comunidades, e principalmente servindo de comunicação em rede com outras cidades e outras culturas. Daí seu caráter originalmente cosmopolita. Embora a relação de um mercado com a população não enseje as mesmas características tradicionais de uma praça, onde o principal fator de espacialização é o encontro de uma coletividade possível de ser organizada, o mercado tem como maior característica espacial a necessidade e a importância da função de circulação. E esta circulação tem que atender, de modo balanceado, às questões de orientabilidade e a questões do acaso, ou seja, causar surpresas e encontros imprevistos por meio de trajetos menos óbvios e mais labirínticos. E esta parece ser uma das características mais perenes desde a organização dos primeiros mercados. 2. A proposta No lote para a implantação do Mercado Público de Blumenau, coexiste um conjunto de relações e trajetos proporcionados pelas vias existentes de fluxos diferenciados e pelas edificações e projetos adjacentes que deverão ensejar o desenvolvimento do local por meio de seu plano diretor. Dos pólos previstos para dar ânimo à região, temos equipamentos urbanos de grande porte - como O Centro de Convenções, a Vila Germânica e o Galegão - e dentre os resultados do uso diversificado que ali se dará, destacamos a complexidade dos trajetos, sejam eles de veículos, pedestres ou ciclistas. Sendo assim, a proposta aqui apresentada procura dar resposta a essas demandas diversificadas e às diretrizes estipuladas pelo programa. A partir de várias questões que envolvem o caráter e a imagem de um Mercado Público, de um comércio aberto e de sua relação com a rua, é que podemos descrever os elementos construtivos que agenciam seu espaço. Não nos referimos apenas à imagem que o edifício deverá ter para os habitantes locais e para aqueles que vêm de fora, falamos aqui de como a ambiência pretendida poderá efetivar a posse do lugar, a fim de que ele se torne dinâmico e seja combinado numa unidade coerente. Pensando nisso, parte-se de uma ideia de síntese e contraste. Para marcar o lugar e lhe dar a delimitação desejada, posicionamos uma cobertura capaz de abarcar as atividades que ali estarão presentes. Em seguida, buscou-se uma conciliação funcional e imagética para conjugar as diferentes funções do mercado. No térreo trabalhou-se a ideia de transparência e integração entre acessos e fluxos distributivos diretos; no nível superior, do mezanino, a predominância de uma integridade volumétrica garantida pela empena que dá delimitação às galerias que circundam as periferias do bloco naquele nível. Assim, superamos uma aparente limitação quanto à impossibilidade de ampliar a área de circulação do mercado em função de cumprir com o maior rigor possível às normas do edital. Há ainda outras conveniências nessa opção: ocultar as instalações e setores de serviço; dar à fachada uma leitura sintética que fortaleça a imagem do mercado. Essa solidez imagética e construtiva é também propícia ao meio que aqui propusemos para os anúncios e letreiros: para livrar a fachada de possíveis intervenções desordenadas, eles – sejam de eventos, ou de estabelecimentos especiais – estariam dispostos em bandeiras postas em cadência no acesso principal, pela rua Alberto Stein, na mesma modulação dos pilares no sentido longitudinal, 7,2 metros. Para fechar o mercado nos períodos em que não estiver em funcionamento, dispusemos portas de correr que abertas ocupariam porção menos privilegiada da fachada permitindo uma visual livre às vitrinas e à circulação. 3. A questão ambiental A combinação dos elementos aqui descritos e sua unidade plástica foram pensadas também em consonância com o conforto climático do mercado. Uma vez que a cidade apresenta características de instabilidade, com estações do ano pouco definidas, este controle deveria ser bem flexível. A temperatura média mensal de 20,1°C, não oferece maiores dificuldades de gerenciar um ambiente de conforto. Exceção feita aos períodos críticos do verão, onde a temperatura pode atingir 40°C, com alta umidade relativa do ar; e no inverno quando a incursão de massas de ar frio pode ocasionar num acentuado declínio de temperatura mínima nas áreas serranas da Região Sul, com valores médios trimestrais variando entre 8°C e 18ºC. 4. O módulo Para dar maior propriedade entre vedação e elementos portantes, parte-se da ideia de um módulo básico de 1.20 metros que conciliasse as funções em todos os níveis e desse a medida da cadência das estruturas. Assim, as linhas de pilares no sentido longitudinal distam 7,2 metros entre si e na seção transversal concilia as diferentes alturas do desenho da cobertura que permite o recolhimento e aproveitamento das águas pluviais e a iluminação zenital difusa. Aqui cabe ressaltar um outro aspecto sobre as visuais do entorno para o mercado: por haver uma grande possibilidade de que ele seja visto acima de sua cota de coroamento, os planos de cobertura oferecem rica diversidade de visuais, sendo tratada como uma quinta fachada, e não como depositário de funções técnicas alheias à ambientação dos demais pisos. Essas funções já possuem trechos específicos, cuja volumetria não fere a integridade plástica aqui pretendida. A fim de evitar problemas construtivos em virtude do lençol freático próximo à cota de soleira (2,5m conforme informado em resposta às consultas), optamos por levantar o piso térreo do mercado em 50cm. Os acessos de pedestres dão-se por piso inteiramente rampado em todo o perímetro do mercado. 5. A setorização Uma leve hierarquia entre entradas é criada por meio de um afastamento mais generoso na divisa com a rua Alberto Stein, denotando a maior importância neste acesso conforme pedido pelo edital. Assim cria-se um espaço de distância em relação aos carros da rua ampliando deveras o espaço da calçada. Tal gesto é importante para que o contraste entre as duas fachadas da “esquina” Humberto de Campos x Alberto Stein fique evidente e participe da vida da cidade. Procuramos a todo instante a consonância dos elementos construtivos com a disposição das atividades, não só no interior do mercado, como também nas calçadas circundantes e que suas partes permitissem grande flexibilidade no uso e organização dos espaços. No térreo estão dispostas atividades de maior natureza local e cotidiana e que por isso requisitam maior dinâmica e infra-estrutura para a reposição de mercadorias. Na porção central, estão os boxes de verduras, frutas e embutidos. As circulações de serviço foram dispostas visando o menor conflito com os visitantes ocasionais e consumidores cotidianos, tanto no térreo, para os boxes de frutas e verduras, quando no mezanino, para os boxes de serviço e cozinhas. Na porção posterior do bloco, em relação direta com a rua de serviços e com as docas de carga e descarga, estão dispostos os boxes de carnes e peixes. O setor de carga e descarga foi disposto de tal forma contemplasse a existência de local adequado ao recebimento, armazenamento e preparação de peixes, carnes e mercadorias perecíveis, estão incluídas aí as verduras e demais mantimentos que deverão ser transportados a piso superior. Uma rampa permite que o acesso à carroçaria se dê em nível. Para melhor dinâmica de ocupação por parte os comércios de alimentação já estipulados no programa – chopperia, pastelaria, café e confeitaria – a proposta é de posicioná-los conjugados à alameda criada na testada da Rua Humberto de Campos. Assim, haverá maior diversidade de ocupação nesses trechos, com mesas dispostas nas calçadas. 6. Acessibilidade com controle Nessa fachada, optamos por recuar as esquadrias, deixando uma generosa galeria pública de circulação e acesso. Com esse recuo, deixando as esquadrias alinhadas com o mezanino, é possível ter total controle aos corredores de acesso e às circulações verticais, o que contempla a necessidade do mercado ter setores funcionando em horários distintos. Nessa mesma porção do edifício, uma marquise posta a 2.40 metros do piso fortalece a gradação intelectiva entre exterior e interior e alguns metros adiante, sua secção se repete para configurar o abrigo da parada de ônibus. No nível + 3.60, está o mezanino onde estão dispostos os restaurantes, as lojas que servem à praça de alimentação, os boxes de serviços e as funções administrativas. Uma vez assegurada a possibilidade de controle de diferentes setores do mercado em diferentes horários, procuramos fortalecer a possibilidade de funcionamento do centro gastronômico e de prestação de serviços, conjugado ao espaço gourmet, cuja previsão de funcionamento deveria ser de 365 dias ao ano. No mezanino, prevalece uma ambiência que procura a independência da cobertura como meio de garantir sua identidade plástica e construtiva. Assim, os boxes guardam dela a devida distância e a iluminação se dá, prioritariamente por meio de focos invertidos cuja intensidade luminosa é rebatida pelo forro de cor clara. Todas as 152 vagas foram dispostas no subsolo como meio de garantir e ampliar a prioridade de acesso e permanência dos pedestres. Seu acesso se dá pela via Alberto Stein e a saída se situa na rua Mariana Bronnemann, o inverso do que ocorre com os acessos de carga e descarga. Esse esquema de circulação vai ao encontro das necessidades estipuladas em normas técnicas e permite que o fluxo ali seja mais bem organizado, de forma a gerar o menor conflito possível o caminho dos pedestres. 7. Síntese Em termos gerais, nossa intenção é a de propor uma edificação que seja coerente com a representatividade de Blumenau não só para o sul, mas para o país, sem com isso desrespeitar a tipologia do contexto, pelo contrário: ajudando a fortalecê-la. É assumido aqui o respeito e interesse pela vida pública, pela urbanidade, pela rua, nunca em desacordo com a lógica do convívio, do comércio e das trocas. |