Estabelecer novos significados
O que fala mais sobre o projeto desta casa é a sua implantação no terreno e a criação de uma segunda natureza com espaços de distintas escalas. As ambiências e recantos de diferentes usos buscam se articular ao existente e à vista para o Lago Paranoá de modo sutil e sensível, buscando resolver a contradição entre melhor vista e pior insolação.
De posse do levantamento topográfico e das constantes visitas ao local, decidiu-se preservar ao máximo a vegetação existente, em virtude de seu porte e sua localização estratégica, que, liberando o meio do terreno, poderia emoldurar a casa e ajudar na resolução dos conflitos de privacidade e insolação. A primeira hipótese de se implantar uma área de lazer voltada para o Lago Paranoá, situado a noroeste, foi sendo paulatinamente descartada conforme íamos nos apropriando do programa e terreno. Assim, partimos para a hipótese original de estabelecer um platô intermediário no terreno e sutilmente criar uma situação de mirante para a vista principal, com o olhar atravessando as salas de estar e jantar. A edificação passou, portanto, a fazer a vista principal da casa desde a rua de acesso ao condomínio, cumprindo uma dupla conveniência: preservar a área de lazer no interior do lote e criar essa presença como fachada principal. A área de lazer, configurando uma praça no meio do lote, articula e dá significado também ao recuo dos fundos do terreno, pois a piscina-quadra-de-biribol avança sobre essa área gramada. Na inflexão do “L” abre-se uma cunha para preservar uma árvore existente importante, não pelo seu porte, mas por sua esbeltez e pela forma de sua copa. Esse gesto assertivo cria também a entrada principal da casa e configura um eixo de ligação entre os pavimentos térreo e superior, e entre as duas alas de quartos da casa neste piso. A porção do “L” voltada para a rua interna do condomínio, de acesso à casa, abriga as funções de serviço, cozinha, despensa e garagem, já a porção voltada para a rua de acesso ao condomínio abriga as funções sociais, a saber, sala de jantar, estar, biblioteca e sala de TV. Essas compartilham um espaço único sem divisórias, separadas pelos eixos estruturais e modulações diferentes de esquadria, criando espaços distintos por meio da função e sutilmente envolvidos por paredes baixas e vigas com grande altura que sustentarão prateleiras, quadros, e outros objetos afetivos. A cozinha abre-se francamente para a copa, conjugada ao hall de entrada, e constituem um espaço único com a varanda por meio da abertura de portas pivotantes e de correr, que deixam o vão da esquadria totalmente livre. A subida para o pavimento superior, de quartos e áreas privativas foi pensada para criar um momento de surpresa e descoberta de outras vistas para o lago e para a vegetação existente. Elevar-se no espaço é uma das mais importantes experiências estéticas da arquitetura. Ao chegar no pavimento superior o sujeito encontra um ambiente envidraçado, fartamente iluminado, com vistas para noroeste e sudeste, com saída para as duas porções de laje gramada, útil como um possível solário ou apenas para fruição. A essa altura o Lago Paranoá descortina-se sem o futuro impedimento do vizinho frontal. Os quartos estão organizados, conforme pedia o programa, em duas alas. De um lado a suíte do casal, do outro o escritório-suíte, as duas semi-suítes e o quarto de serviço, que foi alçado ao pavimento superior para poder ser revertido em futuro quarto útil para o restante da família, uma vez que o trabalho doméstico ganhará outro significado no futuro. Ele está diretamente ligado ao pavimento térreo por meio de escada espiral pré-fabricada. Com isso, cremos ter projetado uma residência em profunda articulação com seu belo terreno, constituindo uma segunda natureza esteticamente mais importante que a primeira. Foi pensando na jovem família que a ocupará e nas necessárias modificações futuras, fruto da apropriação de qualquer espaço útil, que ora propomos uma casa tão flexível quanto esteticamente duradoura. |
Residência JMS
[projeto] Brasília, 2012
Autor: Thiago de Andrade Colaboradores: Andrea Denza, Elisa Fadda, Ingrid Fonseca, Renata Neves, Sergio de la Hoz, Sebastian Sangre |